UE e América Latina e o Caribe, unidos para oferecer soluções globais

28 de novembro de 2023

Conheça a nova agenda de investimentos entre a UE e a América Latina e o Caribe, que tem entre seus objetivos a luta contra as mudanças climáticas.

UE e América Latina e o Caribe, unidos para oferecer soluções globais

Num mundo de constantes tensões comerciais, guerras em vários continentes, volatilidades políticas, fricções democráticas e o sempre presente peso das mudanças climáticas, a renovação das relações entre a UE e a América Latina e o Caribe traz novas esperanças para a estabilidade global.

Em setembro deste ano, altas autoridades financeiras da Europa, América Latina e do Caribe fizeram uma viagem a Santiago de Compostela. O objetivo era elevar o relacionamento entre Europa, América Latina e o Caribe para um novo nível, em termos de comércio, economia, cooperação e geopolítica.

Pela primeira vez na história, e após oito anos de relações bilaterais intermitentes e fragmentadas, os Ministros da Economia e Finanças da União Europeia e da América Latina e do Caribe se reuniram para colocar a primeira pedra de uma nova aliança global. Esta aliança visa unir forças e promover uma visão de mundo baseada na sustentabilidade, valores democráticos e cooperação.

Para entender o que aconteceu em Santiago, precisamos voltar um ano atrás, para Madrid. Lá, no CAF - Banco de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe - nos reunimos com o Governo da Espanha para tentar recalibrar as relações entre a UE e a região. A presidência espanhola do Conselho da UE estava próxima, e a ideia de um encontro de Ministros da Economia e Finanças da UE com seus homólogos da região era apenas um pensamento incipiente.

Aos poucos, com a liderança da Espanha e do CAF, a ideia foi tomando forma. A primeira parada foi na Cúpula de Chefes de Estado de Bruxelas, onde a Comissão Europeia anunciou uma agenda de investimentos de 45 bilhões de euros para a região, canalizados através do Global Gateway. E a jornada chegou a Santiago de Compostela, onde construímos novas pontes para o relacionamento entre dois blocos que, devido aos seus laços históricos, culturais, familiares e comerciais, estão destinados a colaborar mais de perto para enfrentar os grandes desafios globais.

A reunião de Santiago é um primeiro passo para o que, com o tempo e o esforço de todos, pode se tornar uma aliança global que proteja a sustentabilidade do planeta. Precisamos continuar agindo e promovendo uma visão de médio e longo prazo que transcenda os ciclos políticos e se concentre em superar as lacunas socioeconômicas da região e na Agenda 2030.

Não podemos nos contentar com reuniões esporádicas. Por isso, em Santiago, concordamos com novos mecanismos de acompanhamento dos investimentos europeus, que incluem reuniões trimestrais para compartilhar boas práticas e considerar os próximos passos para ampliar a agenda de investimento. A primeira dessas reuniões ocorrerá em Bruxelas no primeiro trimestre de 2024.

Devemos preservar esse espaço de diálogo e verificar o processo desses 45 bilhões de euros que queremos que sejam executados até 2027 através de projetos que impactem toda a região. Hoje, temos meio milhar de bancos de desenvolvimento em todo o mundo, fornecendo 12% do financiamento global e trabalhando de forma mais coordenada, como vivenciamos na cúpula Finance in Common em Cartagena, Colômbia. Mas não é suficiente; precisamos avançar muito mais rápido que a crise.

Até agora, na agenda do Global Gateway, identificamos 136 projetos de investimento na América Latina e no Caribe. Dessa lista, a CAF tem 70 iniciativas que contribuirão para reduzir a pobreza e a desigualdade, impulsionar a transição verde e justa e a transformação digital.

A implementação do Global Gateway requer audácia, compromisso e mente aberta, bem como reconhecer as assimetrias entre as duas regiões como ponto de partida. Embora tenhamos uma variedade de ferramentas poderosas à nossa disposição, as emergências climáticas, alimentares, financeiras e sociais exigem novas formas de fazer as coisas.

Precisamos aproveitar esse novo ímpeto para redefinir a relação UE-América Latina e Caribe. Os últimos anos refletiram relações baseadas em interesses fragmentados, focados apenas em alguns temas ou nos laços entre certos países. Isso gerou lacunas significativas no comércio e no desenvolvimento sustentável. Ambos os blocos se beneficiariam de uma agenda mais ampla que vincule as regiões como um todo, em vez de acordos entre pequenos grupos de países alinhados em questões ambientais, comerciais e de investimento.

Segundo um relatório recente do Elcano, expandir e harmonizar os acordos comerciais entre os países da região e a UE criaria um espaço econômico imenso: 1,1 bilhão de pessoas e um PIB total de mais de 21 trilhões de euros, semelhante ao dos Estados Unidos. Concluir o acordo UE-Mercosul seria um passo crucial na direção certa.

Para tornar esse potencial uma realidade, os políticos europeus devem ver a América Latina e o Caribe não apenas como uma fonte de matérias-primas, mas como um parceiro igualitário para enfrentar os desafios globais. A região tem um histórico comprovado no desenho de soluções inovadoras: os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, por exemplo, nasceram na Cúpula Rio+20 e são produto dos esforços dos países da ALC para construir um mundo mais equitativo e resiliente.

A luta contra as mudanças climáticas, por exemplo, exigirá investimento em grande escala e inovação rápida, especialmente em novos materiais, formas de mobilidade, serviços digitais e gestão de recursos naturais. A ação climática também cria oportunidades para a transferência de tecnologia transfronteiriça e o fortalecimento da agroindústria. O programa Global Gateway pode continuar focando nesses objetivos, mas precisamos avançar antes da próxima reunião de chefes de estado e governo da Europa e América Latina e do Caribe em 2025.

Um dos instrumentos financeiros em discussão é o relacionado à troca de dívida por natureza, uma opção benéfica para a América Latina e o Caribe, uma das regiões menos poluentes e que sofrerá os piores efeitos do aquecimento global.

Paralelamente, precisamos apoiar os bancos nacionais de desenvolvimento. Por exemplo, a CAF já está investindo na criação do Banco Azul Verde em Barbados, que será um banco de desenvolvimento público com vocação de trabalho regional em todo o Caribe. Ele está focado em preservar a saúde dos oceanos, melhorar as condições de vida das populações nas áreas costeiras e insulares, e fomentar a sustentabilidade em todas as cadeias produtivas.

Outro instrumento inovador são os Direitos Especiais de Saque (DES), um ativo global ao qual podemos dar novos usos com inovação, responsabilidade e vontade política. Podemos considerar opções como usar os DES como solução de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas. Existe um enorme potencial para redistribuir esses ativos para a América Latina e o Caribe de forma inovadora, mudando o sentido da equação para proteger nossos ativos ambientais e acelerar o processo de descarbonização.

Além disso, o uso de garantias e seguros também é um instrumento para a transferência de risco e maior alavancagem pública e privada em projetos com externalidades ambientais positivas.

A nova agenda de investimentos da UE na América Latina e no Caribe tem objetivos claros e a vontade política necessária para avançar. É hora de agir, fazendo nossa parte neste projeto pelo desenvolvimento e sustentabilidade da América Latina, do Caribe e da Europa. É o que nossos cidadãos e o planeta nos exigem.

 

Autores:
Sergio Díaz-Granados
Sergio Díaz-Granados

Presidente Executivo, CAF -banco de desenvolvimento da América Latina e Caribe-